A importância de saber escolher o regime de bens
- Renata Mangini
- 14 de set. de 2020
- 3 min de leitura
Muito me impressionou nos meus anos de advocacia, ao tratar de inúmeros divórcios, como os casais, salvo poucas exceções, desconheciam o regime de bens que regulava suas relações.
E não me refiro, por óbvio, ao conhecimento técnico e às miudezas desses regimes, mas seus principais elementos e consequências para a administração dos bens durante o casamento, um eventual divórcio ou mesmo falecimento de um dos cônjuges.
Nos mais diversos casos em que atuei e continuo atuando, percebi que a questão financeira tende, na maioria dos casos (para não dizer quase na sua totalidade), a ser não apenas um possível fato gerador para a separação de um casal, mas um assunto desencadeador para diversas ações litigiosas intermináveis que discutem partilha de bens.
Muitas dessas discussões existem não apenas em razão da frustração pelo término da relação ou por questões familiares mal resolvidas e que nada tem a ver com o patrimônio em si, mas também grande parte delas advém de uma falta de conhecimento sobre o regime de bens adotado pelo casal.
Explico:
O regime de bens é um conjunto de regras privadas escolhidas pelo casal para regular as relações patrimoniais familiares (i) durante o casamento ou união estável, (ii) em caso de divórcio ou dissolução de união estável e (iii) no caso de falecimento.
Em grande parte das ações litigiosas envolvendo partilha de bens, seja em razão do falecimento de um dos cônjuges, seja em razão do divórcio, verifiquei que, muitas vezes, os cônjuges não compreendiam muito bem como se regulava essa relação patrimonial do casal, o que desencadeava tais disputas.
Isso porque, embora durante o casamento tivesse havido um crescimento de patrimônio (aparentemente do casal), existindo, assim, certa expectativa na divisão desses bens, na prática o que se vislumbrava era, muitas vezes, a incomunicabilidade desses bens. Ou seja, em um casamento de 30 anos, por exemplo, um dos cônjuges imaginava ter construído um patrimônio que, na realidade, sempre pertenceu ao outro, saindo da relação com menos ou nada do que imaginou.
E é exatamente aí que a ausência de conhecimento sobre o regime de bens adotado quando do casamento pode gerar não apenas frustrações e litígios desnecessários, como pode arruinar um planejamento patrimonial de vida.
Conhecer e conversar sobre esse assunto quando se pretende casar ou constituir união estável é fundamental para alinhar os interesses e expectativas do casal. É saber qual é a regra do jogo para se jogar de acordo.
Não à toa nossa legislação civil traz diversos regimes de bens que procuram ser coerentes para diversas realidades e interesses patrimoniais. São eles:
a) Comunhão parcial de bens;
b) Comunhão universal de bens;
c) Separação total de bens;
d) Separação obrigatória de bens;
e) Participação final nos aquestos.
Para escolher um deles é necessário que o casal discuta como se dará a questão financeira nessa nova família que se forma. Sei que ainda em nossa cultura é um tema muitas vezes evitado, mas acredite em mim, é importante falar sobre isso para evitar muita dor de cabeça no futuro.
Entenda que cada um desses regimes possui uma lógica de existir e pode se adequar melhor ou pior a uma situação financeira ou familiar preexistente, ao que se pretende construir na vida conjugal e ao que se quer deixar no momento do falecimento.
Em resumo, são 3 momentos que devem ser observados na escolha do regime de bens:
1) Durante o casamento: como ocorre administração dos bens.
2) Em caso de divórcio: como seria uma eventual partilha.
3) Em caso de falecimento de uma das partes: como se dá a divisão do quinhão em relação aos bens comuns e aos particulares.
Sabendo como cada regime regula a situação patrimonial nesses três momentos, algumas questões importantes para serem conversadas entre o casal:
1) Definição se querem constituir patrimônio conjunto. Se sim, qual o limite disso?
2) Como o casal quer administrar os bens durante o casamento: quer mais ou menos interferência do outro cônjuge?
3) Pensar na possibilidade de um dos cônjuges parar de trabalhar, seja para cuidar dos filhos, enfermidade ou qualquer outro motivo. Como se dará a construção do patrimônio nessa hipótese?
4) Como se dará a partilha dos bens no caso de divórcio ou falecimento de uma das partes?
5) No gancho do item “4”, qual o quinhão que cada cônjuge quer receber no caso de divórcio? E no caso de falecimento, pensando que talvez exista um filho como herdeiro, como ocorrerá a divisão dos bens?
6) E na hipótese do casal não ter filhos, como ocorrerá a divisão do patrimônio em caso de falecimento, considerando talvez a existência ainda de ascendentes (pais ou avós) vivos?
Muita coisa? Esses são questionamentos básicos, mas importantes, que sugiro que o casal faça antes de se casar ou viver em união estável.
Nas próximas publicações vou abordar os regimes de bens em suas noções gerais e explicar como funciona a dinâmica e o propósito de cada um deles.
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