O Regime da Comunhão Universal de Bens
- Renata Mangini
- 29 de set. de 2020
- 5 min de leitura
Atualizado: 1 de out. de 2020
Hoje vamos falar do regime da comunhão universal de bens. Ele é parecido em vários aspectos com a da comunhão parcial de bens, então se você não leu o texto sobre o regime da comunhão parcial, sugiro a leitura antes de adentrar na comunhão universal.
Ainda vemos muitas pessoas casadas por esse regime, pois até 1977, antes da entrada em vigor da Lei do Divórcio nº 6.515/1977, esse era considerado o Regime Legal. Atualmente o regime legal é o da comunhão parcial de bens.
Então, para se casar pelo regime da comunhão universal de bens, é necessária a elaboração de pacto antenupcial.
1) Como funciona o regime da comunhão universal de bens durante o casamento
As premissas desse regime são bem parecidas com o da comunhão parcial de bens, vejamos:
É irrelevante saber qual pessoal do casal efetivamente pagou pelo bem adquirido durante o casamento, se pagou pela maior parte ou pela menor parte, pois se presume nesse regime a colaboração mútua, ainda que um dos cônjuges não tenha efetivamente contribuído financeiramente.
Do tópico acima extraímos a segunda premissa: nesse regime há o entendimento da colaboração indireta. Ou seja, a pessoa que fica em casa para cuidar dos filhos e/ou não trabalha, também está contribuindo indiretamente para a conquista do patrimônio, pois além dessas funções domésticas serem igualmente relevantes para a manutenção da família, o cônjuge que fica em casa garantiu os meios necessários para que o outro cônjuge pudesse se dedicar à parte financeira.
Assim, pouco interessa no nome de quem está determinado bem adquirido durante o casamento. Mesmo que comprado apenas em nome de um dos cônjuges, esse bem será dos dois e, portanto, partilhável em caso de divórcio.
As dívidas adquiridas durante o casamento, ainda que em nome de um dos cônjuges, pertencem aos dois.
Quanto à administração dos bens durante o casamento, ocorre da mesma forma que no regime da comunhão parcial de bens: a administração do patrimônio comum compete a qualquer dos cônjuges.
Contudo, para que um bem imóvel, por exemplo, seja vendido, doado, ou seja, atos que envolvam redução de direitos e da propriedade, será necessária a autorização expressa do outro cônjuge (chamamos de outorga uxória ou outorga marital).
OBS. IMPORTANTE: Isso vale também para os bens imóveis particulares!
Conclusão: nesse regime, assim como na comunhão parcial de bens, saiba que haverá algumas limitações na sua gestão patrimonial, mesmo sobre os bens particulares (que são exceção nesse regime).
2) Como funciona o regime da comunhão universal de bens em caso de divórcio
A regra geral desse regime é a seguinte: comunicam-se todos os bens anteriores ao casamento, bem como os presentes e futuros.
Isso significa dizer que ao se casar pelo regime da comunhão universal de bens, conforme preconiza o artigo 1.667 do Código Civil, todos os bens que cada pessoa do casal já possuía quando solteira agora passa a ser do casal. Também significa que todos os bens, em regra, adquiridos durante o casamento são do casal.
Em resumo: agora tudo é nosso!
Vocês se lembram de que no regime da comunhão parcial de bens a regra era que as doações e heranças recebidas durante o casamento permaneciam no patrimônio particular daquela pessoa que recebeu tais bens? Ou seja, aqueles bens recebidos não seriam partilhados com o cônjuge em caso de divórcio.
Ocorre que no regime da comunhão universal de bens, por sua vez, seguindo a sua regra geral, determina que os bens recebidos por herança e doação entram sim no patrimônio comum do casal e, portanto, deverão ser partilhados em caso de divórcio.
Também serão comuns, assim como no regime da comunhão parcial de bens, os frutos dos bens particulares, desde que vençam ou sejam recebidos na constância do casamento.
São comuns também as verbas trabalhistas e o FGTS: O STJ já entendeu pela comunicabilidade desses valores, desde que o fato gerador tenha ocorrido durante o casamento.
Portanto, nesse regime os bens do casal constituem um só patrimônio, caracterizando-se pela comunicabilidade, ressalvadas pouquíssimas exceções.
Ok, quais bens, então, não serão comuns?
Os bens incomunicáveis no regime da comunhão universal de bens, ou seja, que não pertencem ao casal, mas apenas a uma das partes e, portanto, não serão partilhados em caso de divórcio, estão previstos nos artigos 1.668 e 1.659 do Código Civil e são os seguintes:
a) “os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar”;
>> Quando uma pessoa tem vontade de transmitir um bem a alguém casado pelo regime da comunhão universal de bens, sem que esse bem também integre o patrimônio do cônjuge desse beneficiário, deve constar expressamente no instrumento de transmissão, seja por doação ou por testamento, a cláusula de incomunicabilidade.
>> Os sub-rogados: de forma simplificada, sub-rogação é a substituição ou troca de um bem particular por outro bem (lembrando que neste regime é exceção existirem bens particulares).
b) “os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva”;
>> Fideicomisso: o fideicomisso é uma espécie de substituição testamentária, na qual a propriedade de um bem é transmitida a um herdeiro (ou legatário), com a obrigação de que esse herdeiro, por sua morte ou sob determinada condição, transmita-a a outra pessoa indicada pelo testador.
hãn???
Exemplo: “A” deixa em seu testamento um imóvel para o herdeiro “B”, que, por sua vez, fica obrigado a transferir, sob alguma condição, o bem para “C”.
Na prática, o imóvel será de “B” apenas por um tempo, pois “B” estará obrigado a transferir o bem para “C” quando acontecer a condição prevista no testamento de “A”.
Como isso entra no regime da comunhão universal de bens? O imóvel que “B” recebeu por um tempo não integrará o patrimônio comum de “B” e de seu cônjuge.
c) “as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum”;
>> As dívidas anteriores ao casamento pertencem à pessoa que a contraiu. No entanto, caso essas dívidas anteriores tenham sido criadas para a compra do imóvel do casal, da mobília desse imóvel, a elaboração da festa de casamento, do enxoval, ou seja, se essa dívida foi contraída em benefício da família, aí sim serão comuns e, portanto, partilháveis.
d) “as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade”;
>> São as doações entre cônjuges antes do casamento, de forma que o bem doado não passe a ser do casal, mas somente ao beneficiário que recebeu esse bem, daí a necessidade de cláusula de incomunicabilidade.
e) “Os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659”;
>> São os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão, o salário de cada cônjuge e as pensões.
OBS.: Vale aqui a mesma crítica feita no post sobre regime da comunhão parcial de bens quanto ao salário. Parece que a redação da lei não foi muito feliz ao dizer que o salário não seria um bem comunicável. Na prática, o entendimento já é consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, no sentido da comunicabilidade desses valores.
3) Como funciona o regime da comunhão universal de bens em caso falecimento de um dos cônjuges
Primeiro de tudo, vamos lembrar que meação não se confunde com herança. Meação é o um instituto de Direito de Família que depende do regime de bens adotado.
Herança, por sua vez, é um instituto do Direito das Sucessões que surge com a morte de uma pessoa.
No regime da comunhão universal de bens, no qual praticamente todos os bens são comuns do casal, o cônjuge sobrevivente terá direito a 50% do patrimônio comum, que é sua meação. Essa parte sequer entrará no cômputo do inventário, inclusive não sofre incidência de imposto causa mortis, aqui no Estado de São Paulo, o ITCMD.
Os outros 50% do patrimônio comum serão efetivamente objeto de inventário e o cônjuge sobrevivente não terá direito a mais nada caso existam outros herdeiros.
Ou seja, caso existam filhos, por exemplo, o cônjuge não concorrerá com eles a uma quota parte desses 50% de patrimônio. Sua parte será apenas aquela referente à meação;
Caso existam bens particulares (como dito, esses bens são exceção nesse tipo de regime), existe grande divergência na doutrina se eles seriam herdados em concorrência entre o cônjuge e os demais herdeiros. De toda forma, entendo que, por analogia à comunhão parcial, o cônjuge concorrerá nesses bens em quota igual com os demais herdeiros.
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